Homenagear Militana Salustino do Nascimento, mais do que ajudar a preservar um patrimônio cultural brasileiro, é fazer justiça e provar que este não é, ou não pode ser, um país sem memória. Dona Militana teve o seu momento de glória no início dos anos 90, quando estudiosos da cultura popular do Rio Grande do Norte, como Deífilo Gurgel e Dácio Galvão, estiveram em épocas distintas no Sítio Oiteiro, em São Gonçalo do Amarante, para ouvir de perto esta que é considerada a principal guardiã do romanceiro medieval nordestino. Dona Militana canta romances. Seu universo imaginário é feito de modinhas, xácaras, coco, toadas de boi, romarias, desafios, cancela, parcela, moirão, aboios, jornadas de chegança e fandango, gêneros que criam o ambiente propício para cantar histórias de reis, princesas, súditos, plebéias, cangaceiros, santos, escravos e coronéis, que remontam há 600, 700 anos. Sabe de cor as aventuras trágicas, os romances de amor e morte, as histórias de vinganças e ciúmes, peças raras dos romanceiros ibéricos e brasileiros, aprendidas com o pai, Atanásio Salustino do Nascimento, também um figura popular do folclore de São Gonçalo do Amarante. Mas não foi um aprendizado amoroso, passado carinhosamente de pai para filha. Dona Militana, a mais velha de nove irmãs, nasceu em março de 1925. Ainda menina foi para roça, trabalhar ao lado do pai. Ele cantava, ela ouvia, aprendia, mas não podia cantar. Tinha uma vida espartana feita apenas de trabalho. Foi assim até ser descoberta e passar da condição de arquivo vivo a patrimônio nacional. Um pouco da impressionante sabedoria de Dona Militana está preservada nos CDs Songa Também Dá Coco (1999) e Cantares (CD triplo, 2000). Chegou a apresentar-se em São Paulo e no Rio para mostrar estes trabalhos. Foi saudada como uma descoberta tão importante para a cultura nacional quanto a violeira Helena Meirelles e a jongueira Clementina de Jesus, também revelações tardias que ajudam a traduzir a cultura popular brasileira. Mas nada disso tirou Dona Militana da sua condição de mulher pobre que ainda vive no Sítio Oiteiro em uma casa de taipa, semelhante a outras ao lado que abrigam algumas de suas filhas, seus 68 netos e perto de 30 bisnetos.
Faixas:
01 Songa
02 Côco de Roda
03 Viola Voz, Violo Não
04 Romances Populares
05 Songa Também dá Côco - Claves de Sol - Calembando
06 Jornadas de Louvação
07 Maria Rosa
08 Pomaça
09 Toadas de Boi
10 Nova Aurora
11 Embaixadas de Rei
12 Fulô de Guanduba
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